A sociedade em que vivemos parece ressoar com a ideia de mérito. A meritocracia, como é conhecida, propõe que as pessoas devem ascender em suas carreiras e alcançar instituições de elite com base em seus próprios méritos. No entanto, nos deparamos com a falácia por trás dessa noção. No passado, universidades de elite como Harvard e Oxford selecionavam seus estudantes com base em linhagem familiar e pedigree. Hoje, aparentemente, a entrada nessas universidades é determinada pelo mérito, mas escândalos recentes revelaram a existência de corrupção, com pessoas sendo admitidas "pela porta dos fundos", de forma ilegítima.
Além disso, no mundo acadêmico, o sistema de avaliação por pares, que determina quais artigos podem ser publicados e quais pesquisadores progridem em suas carreiras, também tem sido alvo de controvérsias devido a fraudes e corrupção.
As métricas usadas para medir o mérito, como o número de publicações ou o fator de impacto, apresentam falhas significativas. O número de publicações muitas vezes reflete mais a posição de poder e hierarquia do autor do que sua criatividade e originalidade. Da mesma forma, o coeficiente de impacto está intimamente ligado ao preço que se paga para publicar em determinadas revistas, o que pode gerar desigualdades significativas entre pesquisadores de diferentes países.
Como resultado, o sistema que supostamente valoriza a produtividade e o mérito acaba privilegiando aqueles que possuem posição de poder e recursos financeiros, criando uma armadilha que engana a ideia de mérito genuíno.
Para alcançar essas métricas, os pesquisadores recorrem a formas que não são totalmente legítimas, assemelhando-se à entrada ilegítima em instituições de elite. É como se existissem "portas do meio", representadas por aqueles que podem pagar taxas de publicação elevadas, e "portas dos fundos", associadas à corrupção e fraudes que vêm à tona nos escândalos recentes. Diante disso, a meritocracia no mundo acadêmico parece cada vez mais uma ilusão, em que os pesquisadores mais criativos e inovadores não são devidamente valorizados.
É claro que precisamos repensar as métricas usadas para avaliar o mérito acadêmico e como as pessoas as alcançam. Criar métricas facilmente manipuláveis não contribui para uma sociedade mais justa e meritocrática. Precisamos encontrar maneiras de valorizar verdadeiramente nossos pesquisadores com métricas que reflitam sua criatividade e inovação, em vez do poder e do dinheiro que possuem. Afinal, se desejamos construir uma sociedade verdadeiramente meritocrática, é fundamental enfrentar e superar essa armadilha que se torna cada vez mais profunda.
Sugestão de leitura
The Tyranny of Merit: What's Become of the Common Good? Book by Michael Sandel
The Meritocracy Trap: How America's Foundational Myth Feeds Inequality, Dismantles the Middle Class, and Devours the Elite Book by Daniel Markovits
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